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“Nenhum país pode solucionar sozinho os problemas”

Com intercâmbio em fóruns como o G20, a política logra mais que com o isolamento, afirma o ministro de Relações Externas Sigmar Gabriel.

08.06.2017

Sr. Ministro, o senhor dirigiu o encontro dos ministros do Exterior dos países do G20, os 20 maiores países industrializados e emergentes, no início do ano em Bonn. É certa a impressão de que a política externa em 2017 significa sobretudo gerenciamento de crises?

Houve raramente épocas em que tantas crises e conflitos ocorreram em sequências tão rápidas. Essas crises são frequentemente muito complexas, 
elas têm distintas causas e efeitos. Elas também são menos isoladas regionalmente que antes. Isso nos ocupa, naturalmente, na diplomacia e nos mantém numa duradoura situação de crise, sem pausa para respirar. Mas não podemos nos esquecer de também olhar para mais longe, para além do gerenciamento cotidiano das crises. Se ficarmos correndo sempre com o extintor de um incêndio para o próximo, vamos combater os sintomas, mas para mim é também importante que nos dediquemos às causas das crises. Por isso, é bom nos encontrarmos em formatos como o do G20 e falarmos bem abertamente sobre como desejamos configurar esse mundo. Essa é a tarefa central da política internacional: a busca de uma ordem global estável e justa.

O que as organizações multilaterais como o G20 podem lograr realmente na política externa? Há uma estreita cooperação delas também, por exemplo, com as Nações Unidas?

Nenhum país do mundo pode solucionar sozinho os problemas internacionais que enfrentamos. 
Mudança do clima, catástrofes humanitárias, terrorismo – tudo isso não se pode combater com o 
isolamento, mas sim somente com parceiros fortes. Nesse aspecto, os fóruns como o G20 são o modelo contrário ao da política de isolamento nacional, que observamos infelizmente em muitos setores no momento. É extremamente importante nesse contexto a coordenação com as Nações Unidas. Esse é o lugar no qual a ordem global pode ser desen­volvida da forma mais efetiva. Lá se junta toda a comunidade internacional. Por isso, a presidência 
do G20 também inseriu na sua programação a meta de apoiar as Nações Unidas tanto quanto possível e por isso, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, participou do encontro dos 
ministros do Exterior em Bonn.

No encontro dos ministros do Exterior, a parceria com a África foi um tema importante – por que ela é tão importante e em que setores ela está principalmente planejada?

A África é um continente com desafios muito diferenciados e complexos. Mas uma coisa é clara: é um continente das chances e do futuro. No G20, estamos de acordo em que devemos reforçar a nossa cooperação com a África. A iniciativa de parceria do G20 com a África é, por isso, uma prioridade da presidência alemã do G20. Nisso, as questões da segurança têm de desempenhar um papel, da mesma forma como o combate da pobreza e o desenvolvimento econômico. Também a implementação das metas de desenvolvimento sustentável é um instrumento importante, a fim de apoiar os países africanos no caminho para a paz, a segurança, o bem-estar e a democracia. Além disso, queremos fortalecer as capacidades da União Africana e das outras organizações regionais africanas. Por esta 
razão, também tivemos a União Africana à mesa, durante o encontro dos ministros do Exterior 
em Bonn.

Com a realização da Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável e do acordo do clima de Paris, a Alemanha quer com o G20 melhorar a perspectiva futura da economia mundial. Que condições prévias têm de ser cumpridas, a fim de que isso seja logrado?

Juntos, a Agenda 2030 e o acordo do clima de Paris são um verdadeiro salto quântico da comunidade internacional na questão da sustentabilidade. Nós fixamos em 2015, sob o teto das Nações Unidas, metas ambiciosas e mensuráveis para um futuro sustentável. A Agenda 2030 tem a possibilidade de tornar-se o projeto de justiça da nossa geração. 
Estou convencido de que não somente o próprio crescimento é importante, mas também o tipo e 
a qualidade do crescimento. Isso se mede não apenas pelo Produto Interno Bruto. Para uma ordem mundial realmente estável, as justiças social, econômica e ecológica são no mínimo tão importantes quanto os fatores políticos, como participação democrática e divisão de poderes.

A globalização é hoje, para muita gente em todo o mundo, um conceito considerado sobretudo negativo. O que a política pode fazer, com fóruns como o G20, para que um mundo interconectado seja digno de ser vivido e sobretudo seja também um mundo mais justo?

Posso entender que, em face da crescente desigualdade no mundo, muitas pessoas estão insatisfeitas. Mas culpada disso não é, contudo, a globalização. Interconexão e intercâmbio nos fazem bem. Elas são também uma chance de levar mais bem-estar a todas as pessoas. Por isso, não se pode tratar de 
impedir a globalização, mas sim de configurá-la de forma melhor e mais justa. Um bom exemplo são as cadeias globais de fornecimento sustentável. Aqui, os setores político e econômico – principalmente, é claro, as empresas atuantes internacionalmente – têm a chance e a tarefa de conduzir a globalização para os caminhos certos. Se os padrões trabalhistas, sociais e ambientais são corretos ao longo de toda a cadeia de fornecimentos, todos lucram com o crescimento – não apenas os chefes das firmas. O G20 vai dedicar-se a esse tema de forma intensiva no próximo ano.

Sobre os pontos crescimento e bem-estar: em muitos países crescem as dúvidas sobre as vantagens do livre comércio. Chegamos agora ao ponto final da era neoliberal? Estamos nos movimentando rumo a uma redução dos entrelaçamentos globais?

Nosso modelo econômico e nosso modelo social baseiam-se no comércio livre e justo. Eu cito um exemplo: na Alemanha, mais de 2 milhões de empregos dependem diretamente do comércio com a Ásia. Através de cooperação e de intercâmbio, nós logramos mais do que com o isolamento nacional numa casa de caramujo. Por isso, vejo certos tons protecionistas, que ouvimos nos últimos tempos, com preocupação. Apesar disso, no final os protecionistas não vão se impor. Para isso, o nosso 
modelo é muito forte. //

CURRÍCULO

ENGAJADO PELAS PESSOAS

Desde janeiro de 2017, Sigmar Gabriel é ministro das Relações Externas. 
O político do SPD foi antes responsável pelas pastas da Economia (2013 até 2017) e do Meio Ambiente (2005 até 2009). Uma das suas questões básicas: O que 
é melhor para as pessoas? Paz, direitos humanos, crescimento inócuo e bom trabalho são temas centrais da sua política.