Fazer mais alarde em prol da democracia
“A arte não pode ser tão fina, que não possa promover um debate político”: Sobre a responsabilidade da cultura em épocas críticas. Seis opiniões.

Em todo o mundo, também na Europa, o populismo e os ressentimentos misturam-se de forma crescente no debate público e político. Valores como tolerância, democracia e solidariedade, que se acreditava estarem garantidos, são cada vez mais postos em dúvida. Que entrementes até mesmo governos de países democráticos lancem mão abertamente de “fatos alternativos” é um sinal de alarme – não apenas na política. Numa época em que há dúvidas crescentes na Europa surgem am perguntam, se e como os criadores artísticos e a indústria criativa devem colocar-se diretamente contra as correntes nacionalistas, que semeiam discórdia.
Discussão aberta precisa de experiência
Sobre o tema “Responsabilidade da Cultura em Épocas Críticas” debateram em Berlim artistas, representantes do setor cultural, profissionais da mídia e autores. O evento “Keine Macht den Lügen!” (“Nenhum poder às mentiras!”) foi organizado pela Fundação Cultural Allianz, pela iniciativa Offene Gesellschaft (“Sociedade Aberta”) e pela associação Gesicht Zeigen! (“Mostre sua face!”), no âmbito da Semana Berlinense das Fundações, em cooperação com a plataforma berlinergazette.de.
Inicialmente anunciada como discussão no método “Fishbowl”, na qual um participante do público pode tomar assento no círculo dos debatedores, a rodada terminou sendo então um clássico pódio de discussão. A abertura da discussão a todos, isso foi constatado nos diálogos da mesma forma como na organização do evento, ainda necessita de mais experiência. Tanto mais importância é assim a advertência expressa nesse dia pelo futuro presidente do Instituto de Relações Internacionais (ifa), Martin Roth: “Temos de deixar de lado a nossa situação confortável e questionar, como podemos fortalecer a política e como podemos apoiar-nos reciprocamente”.
Seis opiniões de convidados do pódio, seis posições no debate de épocas críticas.
“Mostrar o fim da própria tolerância”
Uwe-Karsten Heye, presidente da associação “Gesicht Zeigen!”, porta-voz governamental de 1998 até 2002
“Uma sociedade aberta não pode ser declarada como uma ‘ditadura da franqueza’. Os espaços de eco digital são operados cada vez mais por aqueles que oferecem às pessoas supostas informações, mas que fazem com frequência exatamente o contrário. Precisamos promover um debate sobre como impedir que esses espaços se tornem inteiramente isentos de controle legal. E todos podem e devem mostrar, que chegaram ao fim da própria tolerância, quando se trata de segregação, de xenofobia”.
“A arte não pode ser tão fina, que não possa promover um debate político”
Esra Küçük, integrante da diretoria do Teatro Maxim Gorki e diretora do Fórum Gorki
“Nessa época antifactual, trata-se menos de fatos que de emocionalidade. Nós, como criadores de arte e de cultura, não podemos de maneira alguma manter-nos alheios a esse desenvolvimento. Afinal, nós somos os primeiros a sofrer represálias em países governados por ultranacionalistas. Para mim, a arte é sempre política, e a arte não pode ser tão fina, que não possa promover um debate político”.
“Motivar as pessoas a defenderem a democracia”
Martin Roth, ex-diretor do Museu Victoria & Albert de Londres e futuro presidente do Instituto de Relações Internacionais (ifa)
“A propaganda descarada atingiu entrementes um nível, que nós não vivenciamos mais desde a Segunda Guerra Mundial. Eu tenho a impressão de que já estamos nos acostumando a mentiras com as de um Donald Trump ou de uma organização como Pegida. Temos de engajar-nos para além do nosso próprio raio de ação. Não é suficiente adaptar a nossa programação a esse desenvolvimento e, dentro de um par de anos, abrir uma exposição sobre a democracia. Seria então tarde demais. Em vez de ficarmos presos no círculo vicioso das eternas lamentações, temos de motivar o maior número possível de pessoas, a defenderem a democracia, indo votar”.
“Sim para a Europa, sim para a democracia!”
Ulrich Khuon, diretor do Deutsches Theater de Berlim e presidente da Associação Federal Alemã de Teatros e Orquestras
“O racismo cotidiano existe em muitas cidades e comunidades. Precisamos criar espaço para dialogar com todos e para possibilitar a participação de todos os cidadãos. Conversações, barulho, briga com divergentes – tudo isso tem de ser mostrado também pelos teatros e museus, em vez de recolher-se ao seu círculo cultural fechado. Mas, principalmente, é preciso em certos pontos falar bem alto: ‘Sim para a Europa, sim para a democracia!’. Mesmo que isso seja frequentemente difícil para nós, porque sempre pensamos de maneira lógica e crítica”.
“Língua e literatura podem incentivar alguma mudança”
Terézia Mora, escritora, tradutora e roteirista
“Como escritora, eu me sinto naturalmente comprometida a expor um pouco da verdade, através da minha descrição do mundo, e a utilizar o idioma contra a mentira. Como húngara de nascimento, eu observei as manifestações em prol da Central European University, sediada em Budapeste e que está agora ameaçada de fechamento. O dia dos protestos, 11 de abril de 2017, é ao mesmo tempo na Hungria o Dia da Poesia. Muitos manifestantes escreveram poemas ou versos próprios nos seus cartazes. Isso mostra que língua e literatura podem incentivar ar alguma mudança”.
“Devíamos fazer mais barulho”
André Wilkens, diretor da “Offene Gesellschaft” e autor do livro “Der diskrete Charme der Bürokratie: Gute Nachrichten aus Europa” (“O discreto charme da burocracia: boas notícias da Europa”)
“Em vez de deixar o palco para uma minoria, que semeia o ódio e a discórdia, nós devíamos como adeptos da democracia fazer mais barulho e nos tornar mais visíveis. Às vezes, temos também de ousar ser ‘a favor’. Nossa sociedade não é perfeita, certamente. Mas podemos estar orgulhosos de muitas conquistas democráticas. Nós temos de comemorá-las e ir às ruas em prol delas”.